quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Repetindo a dose



Espero que Deus me fulmine antes com um raio, daqueles que eram muito comuns no Velho Testamento — sem chance para apelo a instância inferior (já que se tratava de uma decisão do Supremo) —, se, algum dia, eu me sentir tentado a censurar um juiz por ter cumprido a sua função só para proteger um partido da minha predileção.

A que me refiro? Leio colunistas isentos como militantes do Talibã a condenar o juiz Sérgio Moro por ter autorizado a divulgação do depoimento de Paulo Roberto Costa, que não estava protegido pelo sigilo de justiça. Um desses colunistas chega a afirmar que o Moro poderia ter esperado mais três semanas. A afirmação é explícita, é arreganhada: o sujeito acha que a ignorância do que lá foi dito faria bem ao brasileiro. Desligadas as urnas, então o eleitor ficaria sabendo: “Ah, então, dos 3% da propina, 2% iam para o PT? Que bom que ninguém me avisou antes!”.

O mesmo senhor vetusto que afirma essa barbaridade babava de satisfação com os vazamentos sobre o suposto cartel de trens em São Paulo, que vinham do Cade — cuja investigação, esta sim, estava e está protegida por sigilo. Que tipo de gente é essa que cobra que se omita dos brasileiros o conteúdo de uma investigação aberta, pública, e que se regozija com a divulgação ilegal de informações? Eu respondo: é uma gente que pretende que petistas e, no geral, esquerdistas estejam acima da moralidade comum e mereçam um tipo especial de proteção.

Sempre que leio um troço asqueroso assim, como aconteceu há pouco, fico com vergonha em lugar da pessoa. Sobretudo porque o sujeito serviria para ser meu pai. Coloco-me no lugar do suposto filho e fico com vergonha. Graças a Deus, o Rubão nunca me fez passar por isso. Quem era o Rubão? Ora, o meu pai, que jamais justificaria a ação de ladravazes e vagabundos só porque fossem seus amigos ideológicos. Até porque não era amigo nem de ladravazes nem de vagabundos. Ganhava a vida trocando molas de caminhão, como operário. Em vez de culpar os outros por isso e por aquilo, ele preferiu me passar uma orientação: “Estude!”.

Daqui a pouco, tentarão mandar o juiz Sérgio Moro para a guilhotina moral, como fizeram com Joaquim Barbosa. Não que ambos sejam iguais ou operem com os mesmos critérios. Nada disso! A única coisa que os une é tomar decisões que estão em desacordo com o partido oficial e com seus porta-vozes oficiosos na imprensa. Para essa gente, uma verdadeira indústria criminosa que estava em ação tem de ser omitida para que ela não contamine a decisão do eleitor. Que caráter tem uma pessoa que defende que a ignorância faz bem à democracia?

É uma gente literalmente nojenta.





Por Reinaldo Azevedo

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