Em uma campanha eleitoral pobre em debates sobre projetos e infelizmente rica em ataques típicos da baixa política, têm havido poucos momentos nos embates em que se pode configurar não apenas divergências de fundo entre candidatos, mas também definir a essência do que pensam.
Uma dessas raras oportunidades ocorreu quando a candidata-presidente Dilma Rousseff, ao responder a uma questão econômica levantada pelo tucano Aécio Neves, estabeleceu uma relação mecânica, simplista, entre combate a uma inflação alta, como a brasileira, e desemprego.
No entender da candidata, se um governo estabelecer 3% como meta da inflação — número citado em entrevista por Arminio Fraga, ministro da Fazenda caso o vencedor domingo seja Aécio —, menos que os 4,5% em vigor, o desemprego irá a 15%, aproximadamente três vezes mais que o atual, na faixa dos 5%, o mais baixo desde o início do cálculo da taxa.
O objetivo da aspirante à reeleição, sob a legenda do PT, é justificar a leniência que deixou a inflação subir ao patamar de 6% e chegar aos 6,7%, acima do limite de tolerância dos 6,5%, e alertar que nada pode ser feito contra, sob o risco de gerar desemprego.
Eleições costumam patrocinar falácias. Esta é uma. Ora, nada na teoria econômica sustenta que mais inflação permite maior crescimento e, por decorrência, mais empregos, gerados de forma sustentada — um dos dogmas professados pelos “desenvolvimentistas”, “escola” da qual a economista Dilma faz parte.
Nem mesmo o Brasil serve de exemplo. O baixo desemprego no país tem curta sobrevida, diante da virtual estagnação da economia. Há muitos metalúrgicos em “lay-off” na indústria automobilística — ficam encostados um período, com parte dos salários paga pelo Estado —, devido ao desaquecimento interno e à crise argentina, enquanto a geração de empregos formais, em setembro, foi a menor desde 2001. O emprego desce a ladeira. E pior: a inflação se mantém elevada, com o país rumo à estagflação, o pior dos mundos. Quer dizer, manter a inflação nas nuvens em nada ajuda ao crescimento. Ao contrário, pois corrói o poder de compra do consumidor, portanto afeta a produção, adia investimentos, forma uma bola de neve.
No próprio continente, as autoridades de Brasília podem encontrar casos de economias com taxas de crescimento elevadas, em comparação com o atual padrão brasileiro, e inflação bem mais baixa.
Chile, Colômbia, Peru e México, não por acaso países mais abertos ao exterior, reunidos na Aliança do Pacífico, estão neste caso: o Chile, com inflação de 5%, em setembro, deve crescer 4% este ano; México, com pouco mais de 4%, expansão algo abaixo de 3%; Colômbia, inflação de 2,8%, crescimento de 4,7%; Peru, 2,7%, expansão de 4%.
Comparados à virtual estagnação brasileira e à inflação de 6,7%, são ilhas de prosperidade, e o desmentido real de argumentos eleitoreiros.
Fonte: O Globo (editorial)
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