Um novo governo deverá acertar a inflação e as contas, atrair investimento e elevar a produtividade. A primeira reforma econômica a encaminhar será a tributária
Acreditamos ser imperativo colocar o país numa trajetória de crescimento. A estratégia começa por acertar a macroeconomia: as metas de inflação e fiscal (ajuste das contas públicas) precisam ser atingidas. Na meta fiscal, é necessário avançar na direção de total transparência. A meta de superavit primário – o saldo nas contas públicas antes do pagamento de juros – deveria ser em torno de 3% do PIB. Seria razoável buscar o cumprimento dessa meta, sem artificialismos, no período de dois a três anos, a depender das circunstâncias e do quadro geral que um novo governo encontre. A inflação também está acima da meta. Mas não faz sentido tentar chegar ao centro da meta, 4,5% ao ano pelo IPCA, num período muito curto. Seria mais razoável chegar lá em dois a três anos. Esse conjunto de ajustes reduziria muito a incerteza, e isso ocorreria de forma virtuosa. O país sairia da recessão. O lado da oferta e do investimento produtivo, hoje travado, começaria a apresentar resultado. Acredito que as taxas de juros de longo prazo cairiam muito. Hoje, o Brasil tem taxas de longo prazo bem altas, entre 5,5 e 6 pontos percentuais acima da inflação. Posta em andamento, a mudança de regime faria cair a taxa de juro de longo prazo. Trato isso como mudança de regime, para diferenciar de um conjunto de medidas. Não é por falta de medidas que estamos onde estamos. Na mudança de regime, buscamos atingir no Brasil taxas de juros e de inflação normais, parecidas com a da maioria de países como o Brasil, sem que isso ocorra de forma voluntarista – portanto, sem abrir mão da inflação baixa e de um balanço de pagamentos (contas com o exterior) razoável.
Teríamos de trabalhar em mais duas frentes: aumentar o investimento e voltar a ter ganhos de produtividade. Nossa meta, ambiciosa, é elevar o investimento de 16,5% do PIB para 24%. A principal locomotiva para isso é a infraestrutura, cujas necessidades se percebem a olho nu. Estamos falando de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, hidrovias, saneamento, energia – que deveriam ser um espaço fantástico para o Brasil investir. Isso requer mais clareza de regras, para atrair o capital. O governo não tem dinheiro para fazer tudo. Seria preciso trabalhar com o setor privado, sob a supervisão do governo, de forma competitiva. Para incentivar o investimento, também temos de incluir uma agenda de reformas microeconômicas. No topo da lista está a reforma tributária. Ela começa por tratar da tributação indireta no Brasil, onerosa e complexa demais. Ela encarece a vida das empresas. É um sistema cheio de distorções. Os impostos cumulativos punem a exportação e o investimento. Isso seria eliminado nessa reforma. Estamos na fase final de desenhar essa estratégia. A ideia é apresentar isso quanto antes, caso vençamos a eleição. Sob o nome “custo Brasil”, há dezenas, centenas de pequenos tópicos que dificultam a atuação do empreendedor. Incluo nessa categoria a necessidade de, ao longo do tempo, redesenhar a estratégia de inserção do Brasil na economia internacional. Hoje, isso tem sido um problema. O Brasil ficou paralisado ao longo dos anos e muito focado em parcerias exóticas, quando deveria abrir espaço para nossas empresas e exportações nos grandes mercados do mundo.
Depois, existe uma agenda de produtividade. Inclui temas como educação, que deveriam ser mencionados sempre quando se fala em economia. A mudança não acontecerá da noite para o dia, mas o investimento nas pessoas é o melhor que existe. Tem impacto também na distribuição de renda. Meu otimismo sobre a possibilidade de melhorar nessa frente vem da constatação de que a produtividade no Brasil é bem mais baixa que em outros países do mundo.
Outro tema importante, que gera mal-entendidos, é o mercado de capitais e a intermediação financeira em geral. O Brasil hoje põe peso demais sobre o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). É importante o BNDES ter mais critério nos empréstimos. É dinheiro subsidiado, público, que poderia entrar no orçamento para educação e saúde. O BNDES deve começar a exigir contrapartida de financiamento privado, porque muitos desses subsídios não têm justificativa clara. Muitas vezes nos acusam de querer fechar o BNDES – ao contrário, o BNDES deve ter papel crescente na infraestrutura e decrescente nos casos que mencionei. Os outros dois grandes bancos federais devem continuar a fazer seu trabalho, com governança melhor, para não ficar fragilizados. Eles têm de funcionar de modo cada vez mais meritocrático e transparente, cada vez menos politizado e aparelhado. Ser politizado e aparelhado é diferente de ter política pública. Ter política pública definida é essencial.
O principal ponto forte da economia brasileira é ser grande e diversificada. Tem tudo aqui. Não dá para dizer ao Brasil para exportar só matérias-primas. O país tem de ter peso no agronegócio, na indústria, nos serviços. O potencial que temos é desperdiçado neste momento. Hoje, há países crescendo 7% ao ano e países crescendo zero. Por que o Brasil tem de ser o zero? O Brasil tem uma agenda paralela de desmontar o que está errado. Só isso já é uma oportunidade. É como no futebol. Você pensa em fazer gol, mas é importante não levar gol. O Brasil vem levando gol em algumas áreas econômicas. Vamos parar de levar gol e começar a atacar na outra ponta. A agenda macroeconômica e de infraestrutura deve ser apresentada o mais rapidamente possível. Não há razão para esperar. A agenda microeconômica segue em paralelo. Essas agendas têm princípio, meio e fim. Com elas, teríamos todas as condições de levar o Brasil a uma taxa de crescimento do PIB de 4%, 4,5% ao ano. A meta não é fácil, mas a considero possível ao longo de alguns anos.
Por Armínio Fraga
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