De alguns anos para cá, virou moda falar em "globalização". É chique dizer que "nosso planeta se transformou em uma aldeia global". Qualquer crítica a esta ideia é logo ignorada ou rotulada de "reacionarismo". Assim, considere-se um ser "globalizado"!
Será nesta qualidade - a de um ser "globalizado" - que aguarda-o sua primeira experiência: sair pelo mundo afora tentando ligar o carregador de sua filmadora em uma simples tomada elétrica. Você irá descobrir que o modelo brasileiro é incompatível com o argentino, que por sua vez difere do norte-americano, que não aceita o inglês, e daí em diante.
Em seguida, aproveite sua viagem para tentar adquirir alguma roupa ou calçado - e prepare-se para sofrer muito com a total falta de padrões que flagela os habitantes desta "aldeia global". A verdade é que dos calçados às tomadas elétricas, das medidas de peso e velocidade às roupas, muito pouco há de "globalizado" neste planeta.
O passo seguinte será procurar, pelo mundo afora, a contrapartida ao amplo "processo de globalização" pelo qual passou o Brasil. Nosso país, generosamente, abriu suas fronteiras e entregou à administração e exploração de estrangeiros atividades estratégicas e fundamentais para o desenvolvimento.
Assim, procure lá pela Europa, América do Norte ou Ásia algum lugar que tenha entregue o mesmo tanto de sua economia a brasileiros - ou mesmo a outro país. Curiosamente, será fácil perceber exatamente o oposto: uma sucessão de barreiras e entraves ao ingresso de estrangeiros que fariam corar de vergonha o "Muro de Berlim".
Prossiga na sua caminhada, e tenha muitas surpresas. Na Argentina, encontre postos com a nossa bandeira vendendo gasolina mais barata que aqui. No Chile, descubra carros fabricados no Brasil sendo vendidos a preços bem mais razoáveis que os daqui. No Japão, perceba que os preços dos automóveis também é menor, apesar de eles serem feitos com matéria-prima importada - quase sempre daqui.
Diante da confusão que a viagem por esta "aldeia global" seguramente está causando em sua cabeça, volte ao Brasil. E tente comprar, aqui, um daqueles produtos de alta tecnologia vistos durante sua viagem nas vitrines norte-americanas ou européias. Descubra, absolutamente perplexo, que em média eles só chegam ao Brasil entre um e seis anos após lançados "lá fora". Tradução: neste mundo globalizado, que se conforme o consumidor brasileiro em comprar quase sempre produtos obsoletos - e a "peso de ouro".
Entenda-se bem: sou contra o isolamento. Acredito no livre-comércio. Defendo a queda das barreiras comerciais. Sim, sou a favor disso tudo - desde que para todos. Porém, o que vejo é um Brasil se "globalizando" em um mundo a cada dia mais regionalizado. Causa-me revolta, enquanto brasileiro, ver nossa economia desnacionalizada às custas da ruína de muitas empresas genuinamente nacionais. Revolta-me o espírito ver algumas de nossas maiores riquezas não-renováveis e atividades mais importantes sendo exploradas por estrangeiros, sem que se tenha a menor notícia de alguma reciprocidade. O fato, esgotadas as boas intenções, é que esta "globalização tupiniquim" que nos empurraram pela goela abaixo mais parece - e perdoem-me o desabafo - monólogo insosso para apascentar bovinos. Ou, em bom português, "conversa mole para boi dormir".
Por Pedro Valls Feu Rosa
Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo
Nenhum comentário:
Postar um comentário