Tive um bate-papo civilizado ontem com um marxista. Sim, descobri que isso é possível. Trata-se de Luiz Carlos Prestes. Calma, não fui a uma sessão espírita com direito à psicografia. Falo do filho do antigo líder comunista. Temos uma amiga em comum. Prestes trabalha com economia da cultura e seu objetivo, agora, tem sido unir esforços em defesa da democracia. Não gosta do PT. Conseguimos, portanto, encontrar algum denominador comum, ainda que, confesso, seja difícil eu aceitar na mesma frase marxismo e democracia: ambos são incompatíveis na prática.
Com fala tranquila (na forma), Prestes se mostrou preocupado com o radicalismo que vem tomando conta do país, onde paixões extremadas impedem qualquer raciocínio mais frio. É preciso pensar o futuro do país, unir lideranças de diferentes vertentes ideológicas para deixar as diferenças de lado e resguardar nossa democracia, hoje ameaçada. Quem são esses líderes moderados? Ambos reconhecemos que FHC tem tentado fazer sua parte, ainda que eu tenha críticas à sua postura um tanto negligente com o PT.
Confesso que considero um tanto irônico o desejo de maior moderação partindo de quem elogia o MST. Mas deixando isso de lado, o conteúdo da mensagem é válido: o Brasil poderia aproveitar um pouco mais de moderação nos debates políticos. O clima está tenso, há extremistas para todo lado, e tem gente querendo dar um golpe de lá (bolivariano) ou de cá (intervenção militar). O país necessita, neste delicado momento, de lideranças que consigam evitar o radicalismo e a tentação de jogar lenha na fogueira.
Foi o tema da coluna de Demétrio Magnoli hoje no GLOBO. Após falar dos malucos do Estado Islâmico, que querem destruir obras de arte para, com isso, destruir o passado e controlar o futuro (sombrio), Demétrio chegou na realidade política nacional, e concluiu:
A fabricação de uma história caricatural, apoiada na dicotomia fácil, contraria a regra implícita da democracia, que é o reconhecimento da legitimidade da divergência. No PT e nos seus tentáculos acirra-se o extremismo retórico. Envenenado, o debate público afunda no pântano da intolerância, degradando-se em briga de rua. É nessa atmosfera impregnada que, como reação, configura-se uma narrativa simétrica, alicerçada em visceral aversão ao lulopetismo. De acordo com ela, o PT não passaria de uma “quadrilha” de celerados consagrada à espoliação do país, enquanto os governos lulopetistas representariam um longo, insuportável, parêntesis na gloriosa jornada nacional.
A crise do governo de Dilma Rousseff inflama a nossa “guerra de memória”, que se esparrama perigosamente dos casulos da internet para o cenário da praça pública. Numa ponta, um Lula acuado, quase ensandecido, convoca o “exército de Stédile”. Na outra, patéticos radicais de salão pregam o extermínio do lulopetismo a golpes judiciais. Quando se celebram os 30 anos do fim do regime militar, renunciamos ao debate democrático. Preferimos esburacar touros alados virtuais com furadeiras de brinquedo.
Demétrio tem um ponto, como Prestes também tem. Mas acho que erram ao jogar os dois extremos no mesmo saco, ignorando que um, representado por parcela ínfima da população e longe do poder, é reflexo do outro, organizado e no poder. O PT vem adotando uma retórica de “nós contra eles” há muito tempo, segregando a população, jogando uns contra os outros como uma estratégia de poder. É natural que isso tenha reação, como sabem aqueles que conhecem a Terceira Lei de Newton.
A internet faz sua parte, acirrando os ânimos e ajudando a criar um clima de “Fla x Flu”. Mas até aqui há uma explicação alternativa que não deve ser ignorada: após décadas de hegemonia da esquerda na cultura, nas escolas e universidades, e até na imprensa, a direita encontrou finalmente sua voz nas redes sociais. Não nego que em muitos casos isso significou um radicalismo tosco, mas as pessoas estavam cansadas de ver radicais de esquerda tratados como “moderados”.
Como autor de um blog bastante visitado pela direita, posso atestar que esse clima de radicalismo existe mesmo. Quando ousei tecer críticas aqui a Jair Bolsonaro, por exemplo, fui alvo de ataques raivosos de muita gente. Passei automaticamente a ser visto como um traidor, um covarde, ou quase um petista! É uma postura que em nada contribui para a formação de um Brasil melhor, plural e democrático.
Já reparei, também, que boa parcela dos leitores quer mesmo ver o circo pegar fogo. Adora quando um deles, do lado de lá, é massacrado, desmascarado, destruído. Os artigos mais profundos, com mais filosofia política e argumentos impessoais, atraem bem menos audiência. Já uma carta contra um idiota feito Juca Kfouri, que merecia ser simplesmente ignorado, fica viral, é lida por mais de 150 mil pessoas em dois dias, e recebe quase 30 mil curtidas. A turma quer duelos, chega ao blog com sangue nos olhos.
Não consigo culpá-los tanto quando lembro que é o PT no poder. Eis meu ponto aqui: tudo isso, que não é positivo para o futuro do Brasil, é uma consequência dos atos petistas. Demétrio rejeita a ideia de que o PT seria uma “quadrilha”, mas pergunto: e não parece justamente isso? Uma quadrilha disfarçada de partido político? Então quer dizer que reconhecer um fato agora passou a ser coisa de radical? Não posso aceitar isso.
A esquerda multiculturalista europeia plantou as sementes do caos, ao ignorar por décadas os alertas de liberais e conservadores de boa estirpe. Deixaram o monstro do islamismo radical crescer em seu próprio quintal, e o “welfare state” quebrar os governos. Tudo isso produziu um ambiente favorável aos representantes da direita radical, como Le Pen. Mas vejam: é um resultado do esquerdismo incompentente!
No Brasil é a mesma coisa. Quando um partido radical e golpista como o PT chega ao poder, começa a adotar uma agenda claramente chavista, aparelha o estado todo, e a “oposição” adota uma postura pusilânime como a do PSDB, é natural que vozes mais radicais da direita conquistem espaço. É o efeito esperado da conivência ou negligência com os radicais de esquerda, tratados por muitos como moderados, o que definitivamente não são.
Por isso estou convencido de que qualquer saída para o impasse do radicalismo passa pela retirada do PT do poder. Enquanto essa turma estiver no poder, adotando esses métodos nefastos e abjetos, será difícil condenar o extremismo de quem não suporta mais o lulopetismo. Qualquer pessoa razoável, afinal, não aguenta mais o PT, suas mentiras, seu discurso segregacionista. Moderação é algo possível somente quando o PT for apeado do governo, estiver longe do poder.
Não desejamos exterminar o PT com “golpes judiciais”, e sim com a aplicação das leis vigentes no país e com a persuasão de maior parcela da população. O PT faz muito mal ao Brasil. Precisa ser politicamente destruído, ou então destruirá de vez nosso país. Enquanto isso não acontece, teremos de conviver com os radicais da direita, como aliados táticos contra um risco muito maior, que é a transformação do Brasil numa Argentina ou Venezuela.
Meu sonho é viver num país que possa debater democrática e civilizadamente quais os melhores rumos para a nação. Isso envolveria a parcela da esquerda mais civilizada, que é a social-democracia representada pelos tucanos, os liberais, e os conservadores de boa estirpe. Marxistas e reacionários não teriam vez nessa pluralidade democrática, pois não respeitam a democracia para começo de conversa. Infelizmente, estamos longe desse ideal. São os radicais que estão dando as cartas. E são os radicais de esquerda que estão no poder, destruindo nossa democracia de dentro dela. Chega!
Por Rodrigo Constantino
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