A crise política fez crescer a crise econômica. O país está com um enorme rombo nas contas públicas e precisa da aprovação de medidas amargas no Congresso. A fraqueza política da presidente Dilma neste início de mandato está provocando dispersão da base parlamentar. Por temperamento, estilo, e pelo que disse no passado, Dilma não consegue convencer nem o seu partido.
A equipe econômica já tem uma missão difícil. Transformar um déficit primário de 0,6% em um superávit de 1,2% do PIB, mesmo estando em uma conjuntura recessiva, que, normalmente, reduz as receitas do governo. Um ajuste de quase 2% do PIB já seria difícil conseguir com o país crescendo, com a redução do nível de atividade, será mais difícil.
A inflação de fevereiro deve ficar acima de 1%, o que manterá a taxa em 12 meses acima do teto da meta. A alta dos juros para 12,75%, ontem, significará mais pressão sobre as contas públicas, porque eleva o custo da dívida, que já subiu muito nos últimos quatro anos.
Os analistas das agências de risco, como os da Standard & Poor’s que estão em Brasília avaliando os dados brasileiros, costumam olhar os indicadores atuais e a dinâmica futura. Quanto é a dívida pública bruta e qual é o seu provável crescimento. Como o país está com quase 7% de déficit nominal, a conclusão clara é que o endividamento tende a crescer.
Os argumentos da equipe econômica são de que algumas sangrias foram estancadas. As transferências ao BNDES não vão mais acontecer. Elas provocaram nos últimos anos quase R$ 500 bilhões de aumento do endividamento. Além disso, os ministros têm a mostrar que já anunciaram várias medidas para reduzir o desequilíbrio primário entre despesas e receitas. O problema é que parte dessas medidas depende da aprovação do Congresso, e ele está conflagrado.
Os petistas rejeitam a mudança no acesso ao benefício do seguro-desemprego, abono salarial e pensão por morte. Acham que isso fere direitos. Até a pensão por morte, que tem gritantes distorções, eles não querem sequer ouvir os argumentos da equipe econômica. O ministro Joaquim Levy teve que cancelar o jantar com a bancada do PT. No começo do governo Lula, o então ministro Antonio Palocci teve um jantar indigesto assim com a bancada do PT, mas acabou convencendo a maioria a manter o apoio à política econômica, que repetia a do governo anterior. Desta vez, não há clima nem para o jantar.
E se o PT não apoiar as medidas, por que o PMDB o faria, se também reclama de não estar sendo ouvido sobre elas e tem duas das suas principais lideranças, os presidentes da Câmara e do Senado, prestes a enfrentarem a turbulência de estarem na lista do Janot?
Hoje, as poucas boas notícias vêm das más notícias. O governo fez a seguinte conta: se a recessão for de 1,5%, o país escapará do racionamento de energia, para alegria da presidente Dilma, que aceita qualquer coisa menos repetir a decisão tomada pelo ex-presidente Fernando Henrique. Alertada por uma autoridade do setor elétrico de que os técnicos do governo acham que as medidas restritivas têm que acontecer, ela respondeu: “falemos nisso em abril.” Até lá, torcerá pela chuva e pela recessão.
Houve no passado momentos de crise que exigiram a aprovação de pacotes de medidas amargas, mas, normalmente, isso foi conseguido pela união da base parlamentar em torno do executivo. Desta vez, o poder de atração da chefe do governo está se desfazendo rapidamente. O que eleva a incerteza sobre o destino das medidas, em geral.
A decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros, de devolver a MP das desonerações, criou um efeito concreto. Mesmo se o projeto de lei enviado pelo Planalto for aprovado, o governo perderá vários meses de arrecadação com a qual contava para o ajuste fiscal. Haverá resistência também à aprovação da correção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física por 4,5%, com a inflação em 12 meses batendo em 7,5%.
Essas duas crises não são boas companheiras. Realizar um ajuste fiscal no meio de desentendimentos políticos é muito difícil. O governo precisará passar para a sua base o sentimento de urgência. O problema foi o que a presidente fez e falou no passado. Ela disse que não havia crise, não faria tarifaço, não havia necessidade de ajuste fiscal e que medida impopular é contra o povo. Terá que dizer: “esqueçam o que eu disse”.
Por Miriam Leitão
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