A situação inusitada na nossa História de as principais empreiteiras do país aparecerem como protagonistas no maior escândalo de corrupção já registrado tem provocado reações paradoxais no governo e no Congresso, com vários membros também envolvidos no esquema. O grande paradoxo é justamente ser a primeira vez em que as empreiteiras são acusadas formalmente, em grupo, de serem agentes ativos da corrupção que campeia na Petrobras.
Serem grandes demais para quebrar, colocando em risco a economia brasileira, já tão combalida, é uma tese tentadora para uma grande pizza, mas não parece provável que venha a prevalecer. Uma solução, que nunca prosperou devido a um forte lobby das empreiteiras, mas que poderia ser uma solução na situação atual, é a abertura do mercado a empresas estrangeiras, o que é proibido por lei no Brasil.
As principais empreiteiras brasileiras têm obras em várias partes do mundo, mas têm garantia de mercado interno, fechado para as grandes empresas internacionais de engenharia de construção civil e obras de infraestrutura. O Brasil não permite a entrada, em seu mercado doméstico, de construtoras americanas, alemãs, francesas, japonesas, italianas, portuguesas.
Outro dia, em uma palestra na Associação Comercial do Rio, perguntado sobre que solução poderia ser dada, eu abordei a abertura do mercado a empresas estrangeiras, e o ex-ministro Márcio Fortes lembrou que a negociação se dá no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). E o Brasil coloca a abertura dos serviços em troca do fim do protecionismo desses países na agricultura e na siderurgia.
Os líderes do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira, e na Câmara, Antônio Imbassahy, ontem denunciaram o que chamaram de “chantagem feita pelo governo federal”, ao atrelar o pagamento das dívidas com as empresas que fazem obras públicas ao apoio ao projeto de lei que modifica a Lei de Diretrizes Orçamentárias para acabar com a meta de superávit primário.
Ministros pediram aos representantes da Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias e da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil que procurem os parlamentares para convencê-los a apoiar o projeto, ameaçando parar os investimentos. Como se o dinheiro que já gastou a mais pudesse retornar para financiar os investimentos que estão em curso.
O temor de que as obras parariam devido à prisão de donos e altos executivos das empreiteiras também provocou a tentativa de um acordão que resolvesse todo o problema com uma multa bilionária que zerasse todas as culpas para um novo reinício. O juiz Sérgio Moro não aceitou o acordo, proposto na semana mesma em que as prisões foram decretadas.
Evoluiu-se então para a tal de repactuação, em que as empreiteiras devolveriam o que cobraram indevidamente das obras públicas para não serem consideradas inidôneas, proibidas de assinar contratos com o governo. Essas negociações estão em andamento, mas nem a Controladoria Geral da União (CGU) nem o juiz Moro aceitam que esse acordo evite as punições criminais devidas.
Algumas empreiteiras optaram por uma linha de defesa heterodoxa, proclamando-se vítimas de extorsão da Petrobras. A tese parece ser contraproducente segundo especialistas, porque o perdão judicial exige um acordo de colaboração entre o Ministério Público e o sujeito ativo do crime que confessa e colabora.
Segundo Cosmo Ferreira, advogado criminal, ex-promotor de Justiça do Rio e procurador regional da República aposentado, “não adianta o ‘extorquido’ dizer que foi extorquido”, estará se incriminando gratuitamente. O “extorquido” é sujeito passivo do crime e, como tal, não tem do que ser perdoado.
Como se vê, o inusitado da situação faz com que todos os atores desse escândalo não saibam como se comportar. Só os membros do Ministério Público e a Polícia Federal, sob a coordenação do juiz Sérgio Moro, parecem ter um caminho seguro para trilhar. A sociedade agradece.
Por Merval Pereira
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