É algo impressionante: sempre que há um vácuo na agenda nacional ou uma visível falta de assunto, particularmente por parte da presidente Dilma, o tema reforma política vem à tona. Foi assim após as jornadas de junho de 2013: lembram-se da Constituinte exclusiva e do plebiscito? Não é diferente agora, quando a presidente reeleita não tem muito a dizer sobre a crise econômica ou o escândalo da Petrobras, e saca a velha arma para distrair a opinião pública.
Digo isso com absoluta tranquilidade porque estudo o tema há 17 anos (lembro-me de um artigo de 1997 publicado aqui mesmo), trabalhei muito por dois anos na Comissão Especial da Reforma Política e fui membro do Grupo de Trabalho de 2013 que produziu uma interessante proposta. Nas últimas semanas, visitei os embaixadores de Itália, Espanha, Alemanha, Estados Unidos e Japão para conhecer melhor ainda o funcionamento dos sistemas políticos, eleitorais e partidários daqueles países. Tanto tempo e energia despendidos revelam com que urgência enxergo a necessidade de uma profunda reforma que fortaleça e avance a democracia brasileira.
O que me assusta é que muitos, “açodados e/ou desinformados”, saem céleres tirando da cartola mil propostas, centenas de soluções. O equívoco está em avançar respostas antes de formular corretamente as perguntas, a partir de um diagnóstico preciso da realidade.
Não se faz reforma estrutural alguma por modismo ou para preencher outros vazios. Não se deve cuspir no prato em que se come. A democracia brasileira se consolidou e, mal ou bem, foi o atual sistema que nos trouxe até aqui desde a transição democrática liderada por Tancredo Neves e Ulysses Guimarães.
Mas o modelo atual dá mostras visíveis de esgotamento. São quatro as questões centrais que exigem uma ampla negociação, visando construir os consensos necessários para a viabilização da mudança:
1) O atual sistema não gera vínculos entre a sociedade e a representação política, não estabelece o controle social sobre os mandatos. Cerca de 70% dos brasileiros não conseguem sequer dizer o nome dos deputados em que votaram dois anos após a eleição.
2) As campanhas atuais são caríssimas e geram uma das portas de entrada para a corrupção. Embora o argumento seja usado como cortina de fumaça para esconder desonestidade, enriquecimento ilícito, corrupção pura e simples, é preciso melhorar as regras do jogo.
3) O atual sistema não fortalece os partidos e não alimenta a solidariedade interna nos partidos.
4) O atual sistema mina a boa governança. Como garantir boa governança e ambiente saudável de governabilidade com 28 partidos representados, a partir de 2015, na Câmara dos Deputados? O presidencialismo de cooptação se impõe por meio do jogo de chantagens e concessões dentro do “dando é que se recebe”. Decisões parlamentares importantes custam ministérios, diretorias de estatais e de agências regulatórias.
Na próxima semana, feitas as perguntas, avançaremos na tentativa de alimentar o debate sobre as respostas.
Por Marcus Pestana
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