segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Parlamentarismo com Dilma, uma ideia em gestação


Está guardada a sete chaves, mas em gavetas diferentes da Câmara, do Senado e de escritórios de juristas e líderes da sociedade civil, proposta de emenda à Constituição que pode (e é assim considerada pelos informantes deste redator) ser a saída de salvação nacional para a grave crise multifacetada que vive o País. É um texto simples: institui o parlamentarismo já, assegura o mandato de Dilma e Temer e marca para seis meses antes da eleição de 2018 um referendo para confirmar ou rejeitar o regime instituído em função do nosso drama político, econômico e moral.

Personagens que tratam da matéria repelem de pronto a idéia de que isto seria um golpe parlamentar, uma conjuração subversiva do Congresso contra a abalada autoridade presidencial. Um atentado, enfim, à ordem constitucional que o Brasil vem mantendo desde que os militares deixaram o Poder.

- De modo algum – sustentou um informante. – Se a presidente Dilma for ilibada no TCU e no TSE, mas persistindo a crise e esta atingindo um limite insuportável política, econômica e socialmente, haveria um único caminho para a governabilidade: a renúncia. Mas é uma saída traumática. E não há indício de que ela vá examinar essa saída de salvação nacional. O “Parlamentarismo com Dilma” esvaziaria a dramaticidade do ambiente político e salvaguardaria a Constituição.

A proposta do “Parlamentarismo com Dilma” é do conhecimento de líderes dos grandes partidos, inclusive do PT, mesmo que eles não possam admitir de público. Mas apurou-se que nem a presidente Dilma nem o vice Michel Temer leram o texto, que teria sido concebido com base nas conversas que ocorrem naturalmente entre as forças políticas e da sociedade brasileira desde o agravamento da situação econômica e da profundidade atingida pela Operação Lava Jato.

- O governo está ao léu e a obrigação da cidadania é encontrar uma saída de salvação nacional. Dilma está ilibada, até prova em contrário. Portanto, seu governo é legal, mas sem legitimidade, como diagnosticou o ex-presidente Fernando Henrique. Este é o sentimento que permeia hoje o mundo político e social, até mesmo lideranças consideráveis do PT admitem abertamente que a presidente pessoalmente vive uma instabilidade dentro da instabilidade do País - disse um dos articuladores da emenda.

A fonte explicou que a saída pelo “Parlamentarismo com Dilma” estará blindada dos erros ocorridos na experiência vivida em 1961/62, quando o Congresso, sob pressão militar, aprovou a mudança do sistema de governo para assegurar a normalidade constitucional e garantir a posse do vice-presidente João Goulart após a renúncia do titular Janio Quadros.

- Naquele tempo – lembrou outro informante - houve a pressão militar indevida para a aprovação da emenda parlamentarista. Agora existe uma pressão legítima, que é a da maioria do povo brasileiro, mais de 90 por cento, segundo índices confiáveis. E deu errado com o Jango porque o próprio presidente sabotava o parlamentarismo. Como detinha maioria no Congresso, Jango desestabilizava os primeiros-ministros. Era crise atrás de crise. Dilma não tem sequer um terço do que Jango tinha. Portanto, ela não ameaçaria a desestabilização do primeiro-ministro.

E o erro mais grave em 1961 – prosseguiu a fonte - foi não se ter marcado a data do referendo. A emenda em gestação não contém este pecado original: estabelece a consulta popular para seis meses antes da eleição de 2018 e ponto final. O premier já assume sabendo que seu governo dura até o dia 31 de dezembro de 2018, quando acaba o mandato de Dilma Rousseff.

Além disso, o primeiro-ministro assumiria com o compromisso de cumprir a agenda econômica e política aprovada pela sociedade através de seus representantes que são os congressistas. O premier será eleito pelo Congresso, mas não seria necessariamente um congressista.

Alguns integrantes da idéia acham que a presidente Dilma deve ter um espaço na escolha do primeiro-ministro de salvação nacional, “uma participação”, mas não com poder de veto. Outros apoiadores da idéia, no entanto, são radicais e afirmam que ela “tem de receber o prato feito”.

- O Brasil – disse um dos informantes deste redator - felizmente tem grandes quadros em diferentes setores da atividade. Não vou fulanizar, porque a fulanização já mata a idéia no nascedouro,

mas as universidades estão aí repletas de homens sábios, o empresariado sadio existe e atua, o Judiciário possui magistrados probos, no próprio congresso existem inteligências capazes da tarefa - disse a fonte. O que não podemos é ficar restrito ao discurso moralista.

Diante da minha insistência em esmiuçar a idéia, um dos informantes chegou a explicar, “teoricamente”, que até mesmo o vice-presidente Michel Temer pode ser uma opção para premier, desde que renuncie ao atual cargo. Mas pediu-me que, se eu fosse escrever, suprimisse essa explicação “porque pode queimar o Temer com a Dilma”.

- Qualquer brasileiro qualificado legalmente pode ser o primeiro- ministro - disse.


- E qual seria o papel constitucional de Dilma? – indaguei.

- O mesmo de hoje, salvo a responsabilidade da administração direta. Esta é exclusiva do premier, que presta contas ao Congresso. A presidente fica no Palácio da Alvorada. Aprisionada? De jeito nenhum. Vai representar o Estado Brasileiro nos fóruns apropriados. É claro que não vai sassaricar por aí com a Angela Merkel nem com o Maduro, mas vai tratar dos temas multilaterais que dizem respeito ao Estado Brasileiro. Não será uma rainha da Inglaterra. O presidente da Alemanha, da Itália, da França, de Portugal, países parlamentaristas, são figurações? - devolveu o meu interlocutor.

O texto da proposta de emenda foi visto por ao menos três juristas de grande conceito nacional. Aprovaram-no com alguns retoques. Pelo menos um importante empresário do ramo da comunicação já tomou conhecimento dele, absteve-se de apoiar ou rejeitar, mas frisou que, se a saída de salvação nacional for esta, contará com a sua solidariedade.
Uma questão crucial para a ideia prosperar é a oportunidade de apresentá-la.

- Neste agosto, mês aziago na política brasileira, a presidente Dilma esteve periclitante no posto – analisa uma fonte. - Foi salva graças ao pacote econômico idealizado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, com o apoio e colaboração do PSDB, via senador José Serra. Tem até o dedo do Aécio, do PT de Walter Pinheiro, do Delfim Neto. Mas esta boia vai se manter no oceano revolto da economia e da intolerância das ruas? - perguntou o político ouvido por quem agora escreve.

Alguns líderes envolvidos na operação acham que a ocasião propícia ao acolhimento da emenda parlamentarista chegará, pois não se está vendo no horizonte a neutralização da crise econômica. E a situação das ruas não melhorou. O povo está intolerante, vaia até ministro em avião. Falta uma diretriz econômica firme e a presidente protela até mesmo as mudanças radicais exigidas pelo momento, como a redução da máquina administrativa, hoje comparável à da União Soviética depois do enxugamento feito pelo líder Gorbachov.

- Pairando sobre a crise econômica – destaca outra fonte ouvida - existe hoje um poder acima dos três poderes constitucionais, que é a chamada República de Curitiba. A Operação Lava Jato conduz o país. É urgente separar o joio do trigo. Hoje não se pode fazer isto porque, embora a presidente é sem dúvida uma pessoa ilibada, ela ao mesmo tempo é também personagem da Lava Jato.

E compara:

- Vivemos hoje uma situação como naquelas peças de teatro do Pirandelo, em que, volta e meia aparece em cena um ator que nada tem a ver com a trama. A Dilma, queira ou não, no caso da Lava Jato, é uma atriz pirandeliana, e este fato inconteste levou o Pais quase à ingovernabilidade neste mês. E corre-se ainda o risco de levá-lo. Por isto exige-se o governo de salvação nacional. Em que todos participem, oposição e situação. Todos a favor do Brasil – concluiu o interlocutor.

Como veterano observador da cena política, antigo repórter, não sei avaliar se o “Parlamentarismo com Dilma” tem condições reais de prosperar. Talvez seja apenas mais uma idéia da mente criadora dos políticos – e nós, contribuintes, os pagamos para que eles sejam assim também, criativos para o bem do País. Criação regada com duas ou três doses de vinho do Porto no almoço dominical da classe média brasileira. Ou talvez a idéia esteja fadada a germinar nos estertores deste agosto aziago...

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