sexta-feira, 14 de agosto de 2015

De novo as ruas


Novas manifestações estão programadas em todo o país no próximo domingo, expondo a indignação da sociedade diante exatamente de quê? Há quem veja nesse cenário o desdobramento natural de uma crise, cujo início remonta a junho de 2013; outros, a continuação de uma apertadíssima campanha presidencial, e, portanto, mero oportunismo político.

Já uma massa de descontentes reverbera o horror à inflação, que lhe corrói o poder de compra. Daí a panela estar na moda. Mas há também aqueles que sinceramente estão preocupados com a saúde das nossas instituições, a rigor ainda em processo de afirmação. A redemocratização do país é uma jovem de pouco mais de trinta anos apenas.

Nesse ponto, pego carona no pensamento do tão reverenciado Raymundo Faoro, figura-símbolo da Ordem dos Advogados do Brasil ao tempo da ditadura, que insistia na mudança (e, de fato, tudo mudou), mas ao mesmo tempo não tinha medo de perguntar sobre o que vem além da mudança.

Mudamos, sim. Alcançamos o Estado democrático de Direito carregando vícios e práticas antigas, deixando prevalecer os pontos de vista dos poderosos sobre os da grande massa de cidadãos. Daí negócios de Estado confundir-se com negócios pessoais, fazendo da corrupção uma instituição igual às outras, ou imiscuindo-se sorrateiramente nelas. A corrupção deixou de ser endêmica e passou a ser institucional. Tornou-se onipresente, onipotente e onisciente, ocupando o lugar em praticamente todas as esferas do Poder.

Por certo, o que as manifestações têm a dizer é que queremos algo além das práticas triviais da democracia, sobretudo quando sabemos que nas democracias também se abusa do poder, também se adotam processos arbitrários e discricionários, forjados à surdina, desprovidas de conteúdo social e que servem apenas para legitimar quem detém o monopólio do poder.

O rol de escândalos, a dança das cadeiras nos postos dos altos escalões da administração federal, as suspeitas de enriquecimento ilícito à custa do erário público, tudo isso fermenta uma massa onde se misturam indignação, raiva e medo.

No mundo atual, as ordens estabelecidas estão sujeitas a questionamentos das formas mais surpreendentes e rápidas, levados por uma coesão de palavras e idéias que ultrapassam fronteiras. Nunca o individual foi tão poderoso como agora, justamente por concentrar na palavra transmitida em tempo real a aspiração coletiva.

O desafio de agora, sobre o qual todos nós temos responsabilidades, está em restaurar a esperança de um futuro melhor e repor a confiança nas instituições. Por isso, não podemos continuar vivendo uma simples “situação democrática”, por mais eleições que possam ocorrer. Queremos uma democracia como valor universal, que se traduza em participação, ética e responsabilidade.

O povo é fonte e base da soberania de um país, e em nome dele o Poder é exercido. Foi a autoridade moral de Sobral Pinto quem trouxe de volta esse princípio básico nos gigantescos comícios que exigiam diretas-já para o Brasil. Hoje, novamente este povo toma as ruas, avenidas e praças exigindo ética na política. Cabe aos agentes públicos compreender a mensagem, sob pena de perderem a fonte de sua legitimidade e colocarem em risco a credibilidade das instituições republicanas.





Por Ibaneis Rocha
Presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB/DF)

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