O mais, digamos, encantador em Renato Janine Ribeiro, novo ministro da educação, é a pomposa solidez de suas tolices. O, a seu modo, famoso professor de “ética” da USP costuma fazer digressões muito eloquentes sobre o nada para chegar a lugar nenhum. Não foi diferente na entrevista que concedeu à Folha desta segunda. Ora, considerando o caos em que se transformaram o Fies e o Pronatec, certamente o jornal esperava, assim, alguma resposta substanciosa do novo titular da pasta; contava ter ao menos um título forte para a primeira página. Em vão. O máximo que se conseguiu foi isto: “Universidade federal deve atuar mais no ensino básico”. O que quer dizer de prático? Lhufas!
Aliás, chega a ser vergonhoso que um ministro conceda uma entrevista sem ter nada a dizer e ainda dê reiteradas e eloquentes provas de ignorância — ou de má-fé. E, para ser franco, quando se é ministro da Educação, a ignorância é uma forma de má-fé, e a má-fé, uma forma de ignorância.
A vigarice intelectual adora criar categorias conceituais novas como se isso mudasse a realidade. Janine, por exemplo, diz que a melhoria dos serviços públicos é a quarta agenda democrática. A terceira, afirma, é a inclusão social, que ainda não está concluída e que, segundo ele, encontraria resistência nas ruas. É mesmo? Qual resistência? Os que protestam contra o governo petista marcham contra a inclusão social ou contra os ladrões? Janine dá mostras de não gostar do que chama de “classe média” na rua. Diz ele: “Em vez de ver politicamente como uma reivindicação global para melhorar, veem como uma coisa imediatista, e atribuem tudo à corrupção. Não chega a ser uma agenda política, ainda”. É? Por que o ministro não vai ao Capão Redondo dar essa explicação? Por que os petistas devotam tanto ódio à luta contra a corrupção?
O repórter da Folha, coitado!, não consegue tirar do Rolando Lero da academia uma única resposta objetiva, nada! E olhem que não falta boa vontade na condução da entrevista. Se Janine tivesse o que dizer, poderia ter cortado todas as bolas na rede e correr para o abraço. Indagado sobre as seis mil creches prometidas no primeiro mandato e nunca construídas, deu esta resposta estupefaciente:
“O que aconteceu no caso das creches foi uma licitação em escala nacional, que acabou tornando difícil a entrega dos produtos. É uma das prioridades que a gente quer resolver o mais rápido possível”. Nos próximos quatro anos?, quis saber a Folha. E ele: “Acredito que sim. Nosso problema hoje é a situação orçamentária deste ano. Uma vez a economia recuperando o seu ritmo de expansão, o Estado continuará capaz de gerar recursos que permitam cumprir nos outros três anos”.
Santo Deus! Nunca houve licitação nenhuma em escala nacional. É besteira. Mais: quer dizer que as seis mil creches serão entregues quando a economia recuperar o seu ritmo de expansão? É mesmo? Qual ritmo? Qual é a velocidade necessária do crescimento para que a promessa se cumpra? Pergunta básica: como teremos uma recessão, neste 2015, da ordem de 1,7%, não se vai, então, fazer creche nenhuma?
Entre bobagens e irrelevâncias, o ministro disse só uma coisa sensata, mas como autodiagnóstico: “Na saúde, você sabe se está doente e precisa de ajuda; na educação, você não sabe se é ignorante e precisa de conhecimento”… É verdade. Alguém que não fosse supinamente ignorante em economia não teria dado aquela resposta sobre as creches. Mas Janine ignora que é um ignorante.
A Folha quis saber se o inchaço do Fies e do Pronatec era, na educação, o correlato do modelo petista de incentivo ao consumo. A ignorância falastrona de Janine produziu a seguinte pérola: “Não vejo um paralelo, porque justamente a crítica principal à inclusão social pelo consumo é que ela não seria sustentável por faltar a base da educação. Eu acho injusta, porque a expansão foi de bens de primeira necessidade, represado, não um consumo de produtos suntuários. Você não pode ter pessoas que não têm produtos da linha branca em casa”.
Em primeiro lugar, a crítica principal ao modelo petista ancorado no consumo era outra, sem prejuízo de apontar a educação precária: o país deixava de fazer reformas que tornassem sustentáveis aqueles ganhos. Os petistas e os acadêmicos perturbados como Janine é que inventaram que havia quem se opusesse a que pobres comprassem geladeira e fogão e frequentassem os aeroportos.
Num outro momento da entrevista, este senhor dispara a seguinte mentira: “A gente pode dizer que o governo Lula, num primeiro momento, constituiu o Bolsa Família, um programa premiado internacionalmente e que deu grandes resultados (…). Num segundo momento, houve a valorização real do salário mínimo, em que a pessoa recebe mais pelo trabalho dela”.
Dispenso-me de lembrar que o Bolsa Família foi criado por FHC. Lula apenas o expandiu. Afirmar que a valorização do salário mínimo começou com o governo petista é mais do que uma mentira: é uma farsa política a que se dedica este sedizente professor de ética. Mas eu refresco a memória dele: FHC assumiu o poder em janeiro de 1995 com o salário mínimo em R$ 70 (veja o site site do Dieese); quando saiu, estavam em R$ 200 — aumento nominal de 185,71% para um IPCA acumulado de 100,67% — logo, o aumento real foi de 85,71%. Nos oito anos de Lula, foi um pouco maior: 98,32%; nos primeiros quatro anos de Dilma, de 15,44%.
Janine não sabe história.
Janine não sabe fazer conta.
Janine é professor de ética.
Janine é ministro da educação.
Janine é petista.
Por Reinaldo Azevedo
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