segunda-feira, 13 de abril de 2015

As lições de 13 países sobre o ajuste fiscal


Na campanha eleitoral do ano passado, a então candidata Dilma Rousseff evitava a qualquer custo admitir a necessidade de fazer aquilo que os comentaristas convencionaram chamar de “ajuste fiscal” – equilibrar as contas do governo, cortando despesas ou aumentando receitas. Falar em cortar gastos públicos, em taxar mais a sociedade, ou mesmo usar apenas o eufemismo “ajuste fiscal” equivaleria para ela a um suicídio eleitoral. Seus marqueteiros preferiram fazer então aquilo que marqueteiros sabem fazer tão bem: mentir.

Uma vez eleita, a prioridade de Dilma foi esquecer a campanha e encarar a verdade. Diante do descalabro nas contas do governo, ela precisava encontrar um ministro da Fazenda capaz de executar o tal “ajuste fiscal”. A busca resultou no nome de Joaquim Levy. Mal ele começou a trabalhar, passou a ser atacado de todos os lados. Pelos políticos, que querem manter distância do assunto e vivem dos recursos públicos. Pela imprensa, que não perde uma oportunidade de torpedeá-lo pelo mais irrelevante deslize verbal. Por intelectuais de esquerda, que chegaram a publicar um manifesto contrário ao ajuste. Os argumentos brandidos nessas horas são sempre os mesmos: o corte nas despesas afeta programas sociais; os gastos do governo são essenciais para o crescimento da economia; e coisas do tipo. Qualquer tentativa de equilíbrio fiscal é vista como “maldade”, feita à custa do bem-estar da população.

Essa bobagem colossal – assinada por gente respeitável, com todos os atestados acadêmicos a garantir seu gabarito intelectual – revela a lamentável indigência das ideias que movem nosso debate econômico. Diante da fama de maldade associada àquilo que na verdade é uma virtude, a temperança, a única pergunta razoável a fazer é: como gente tão inteligente pode ser tão ignorante? Um livro lançado no meio da campanha do ano passado traz a resposta no próprio título: O mito do governo grátis. Seu autor, o economista Paulo Rabello de Castro, faz um diagnóstico das políticas econômicas adotadas em 13 países e conclui que os problemas sempre surgem com a crença ilusória num governo que pode tudo e não custa nada – o “governo grátis”.

Basta analisar o Orçamento, como faz Rabello, para concluir que, no Brasil, o governo custa demais e pode de menos. Suga quase metade do que a sociedade produz para sustentar uma máquina ineficiente, incapaz de prestar serviços decentes em áreas básicas, como segurança, Justiça, saúde e educação. Precisa tomar dinheiro emprestado no mercado pagando juros altíssimos, amarra os empreendedores, inibe a poupança e os investimentos. Durante os últimos 20 anos, só tem feito aumentar os gastos públicos. Para pagá-los, tem drenado mais e mais riqueza da sociedade, em sua sanha arrecadatória. É o que na certa voltará a acontecer com o novo “ajuste fiscal” em curso. Em vez do temível Levy “mãos de tesoura”, o mais provável é vir aí um Levy “mão no bolso” – no nosso bolso.

Pois Rabello mostra como nenhum país está imune às tentações do “governo grátis”. Da Venezuela aos Estados Unidos, da Grécia à Argentina, da Rússia à China, ele exuma os cadáveres de políticas econômicas fracassadas em todo o mundo. O resultado da autópsia é invariavelmente o mesmo: nos lugares em que o governo descuidou do equilíbrio fiscal, o resultado foi mais inflação, menor crescimento e mais pobreza. O equilíbrio fiscal, portanto, não é uma “maldade”. Ao contrário do que pregam nossos iluminados intelectuais esquerdistas, só com temperança nas contas públicas é possível erradicar a miséria e resolver os problemas sociais. A prova disso está nos vários países que adotaram políticas econômicas sóbrias, em vez de se embriagar na fantasia do “governo grátis”. É o que mostram os exemplos de Chile, México, Colômbia, Suécia, Canadá, Suíça e Cingapura, analisados por Rabello.

Embora Rabello se identifique como um liberal, sua análise está longe de ser ideológica. Seus exemplos são plurais e culturalmente diversos. A questão para ele não é o tamanho do Estado, mas sua eficiência – assim como a eficiência da economia. No caso do Brasil, ele faz propostas concretas e viáveis para sairmos da armadilha que, periodicamente, nos leva a aceitar sem reclamar que o governo ponha mais uma vez a mão no nosso bolso. Elas se estendem pelas áreas de tributação, previdência, mercado financeiro, inovação e educação. Todas podem ser criticadas ou aperfeiçoadas. Rabello, também é bom que se diga, não é um estilista do idioma. Seu livro teria se beneficiado de uma revisão cuidadosa, que corrigisse detalhes como o emprego da partícula “se”, a diferença entre as expressões em inglês “tipping point” e “turning point” ou o autor da frase “A Terra é azul”. Mesmo assim, ele tem uma virtude essencial: conhecimento de economia. Uma virtude e tanto se o compararmos aos textos que andam assinando nossos intelectuais.




Por Hélio Gurovitz

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