segunda-feira, 6 de abril de 2015

Anões políticos


O PT se opõe ao ajuste antes de mais nada porque não o compreende, assim como não compreende a crise que ele próprio fabricou 

Uma crise gigante gerida por anões políticos – eis em síntese a encrenca em que está metido o país. O PT, partido que se quer hegemônico, não dispõe de um só quadro, dentro ou fora do Congresso, capaz não apenas de enfrentar a crise, mas, sobretudo, de compreendê-la. Seus nomes do passado lá ficaram.

Lula e José Dirceu, seus expoentes, envolveram-se com o Código Penal e são incapazes não apenas de convencer, mas até mesmo de falar ao público. Lula atém-se a ambientes fechados e impermeáveis ao contraditório, enquanto José Dirceu é refém de advogados criminalistas. O PT mergulhou em profundo autismo.

No Congresso, o ambiente é lastimável. Ter como líder na Câmara alguém da estatura intelectual de Sibá Machado (AC), cujas relações com a lógica e o verbo atormentam taquígrafos, repórteres e colegas de ofício, resume a ópera. Diante de Sibá, Dilma tem a eloquência de um Cícero ou Vieira.

E há ainda figuras patéticas como a deputada gaúcha Maria do Rosário, que chega ao requinte de divergir de si mesma, poupando a oposição de fazê-lo. Ao que parece, não se percebe.

Opõe-se, por exemplo, à redução da maioridade penal para 16 anos, alegando que “cadeia não conserta ninguém”, ao mesmo tempo em que se empenha em agravar delitos (isto é, propor mais cadeia) para temas de sua cartilha do politicamente correto, como homofobia, feminismo e outros.

O que se deduz é que tem duas concepções de cadeia: a regenerativa e a vingativa. A primeira, quando se trata dos seus, é ineficaz e deve ser evitada, mas a segunda, destinada a seus adversários, não: deve ser intensificada. Crime, para ela – e nisso exprime o próprio PT -, não é questão moral, mas ideológica.

No entorno da presidente, há nada menos que nove articuladores políticos - e nenhum articula nada. O espetáculo patético dos dois ministros – Miguel Rosseto (da Secretaria Geral da Presidência) e José Eduardo Cardozo (da Justiça) -, escalados para falar da manifestação do dia 15 de março, não merecia sequer o panelaço com que foram brindados.

Um disse uma coisa e outro o seu contrário. Rosseto viu as passeatas como coisa dos eleitores de Aécio e da elite branca (da qual, aliás, a exemplo do comando de seu partido, faz parte), o que as tornaria banais.

Cardozo captou-lhes a gravidade, embora não saiba como lidar com elas. A má fé cínica e a obtusidade córnea de ambos (para citar a expressão de Eça de Queiroz) sugere que se poupem panelas e protestos. Não merecem sequer vaia.

Em tal contexto, não espanta que um tecnocrata, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afeito à ditadura das planilhas e dos números, desponte como único interlocutor político disponível junto ao Congresso. Na ausência de um negociador dentro do governo, foi pessoalmente conversar com os senadores sobre o ajuste fiscal.

Não lhe pareceram à altura da missão nomes como o já mencionado Sibá Machado ou Pepe Vargas (ministro das Relações Institucionais) ou o senador pernambucano Humberto Costa (líder naquela casa), entre outras eminências partidárias disponíveis.

O PT se opõe ao ajuste antes de mais nada porque não o compreende, assim como não compreende a crise que ele próprio fabricou. Se não a percebe, como vencê-la? Lula diz aos quatro ventos que a crise tem nome: Dilma. Nesse caso, tem também autor: Lula, que a inventou e a entronizou na Presidência.

Não bastasse, há os escândalos que não param de vir à tona – na Petrobras, na Receita, no BNDES, em toda parte. A reação do partido, na falta de argumentos, não muda: evoca a conduta de adversários no passado, na tentativa de banalizar o que fez.

É como se um homicida, flagrado, evocasse Caim para dizer que assassinato é coisa antiga e que não foi inventado por ele. A corrupção do passado – a tal “senhora idosa” a que se referiu a presidente - não absolve nem atenua a do presente. Mais: se o partido a conhece tão bem – e não hesita em atribuí-la também aos tucanos -, por que não a puniu nestes 13 anos de mandato?

A omissão, se efetiva, acresce aos delitos do presente mais um: o crime de prevaricação.

Tais contradições escapam ao tirocínio médio dos petistas incumbidos de gerir a crise. O nanismo mental não as enxerga, o que não impede que prosperem e agravem o quadro.

O resultado está parcialmente expresso nas pesquisas de opinião e nas multidões nas ruas. A propósito, a manifestação popular convocada pelo presidente do PT, Rui Falcão, para o dia 31 de março – e reverberada por Lula -, em defesa da Petrobras e contra o golpe militar de 51 anos atrás, simplesmente não aconteceu. O PT perdeu não apenas o juízo, mas também o povo.





Por Ruy Fabiano

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