segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

O tripé da liberdade cristã: a liberdade da transcendência


A Transcendência é a conseqüência natural dos descobridores do Evangelho Essencial, e o ultimo estagio na caminhada em direção do tripé da liberdade. Temos que passar inevitavelmente pela liberdade da consciência para sermos nós mesmos, percorrer o caminho da liberdade da simplicidade, trilha essencial para adentrar no Reino dos céus, e finalmente se firmar na base sólida da liberdade da transcendência para nos descobrir, andarilhos maltrapilhos rumo à eternidade.

Quando o Artesão-Mestre moldou o barro, no céu ecoou o som de uma sinfonia cósmica perpetrada pelos seres alados e adamá (barro) foi feito poeimê (feitura, poema/composição) o grand finale, criação manufaturada, obra prima das mãos do Artista-Poeta. Então Ele se inclina sobre sua obra maior, e sopra ruah, espírito de vida, e ebuliu no coração recém moldado do homem-modelo, a centelha incandescente da eternidade.

A queda infelizmente resultou na bifurcação de ideais no homem, tornando-o ser ambíguo por natureza. Por um lado, seu corpo e mente clama por satisfazer-se na transgressão, a obstinadamente se realizar na independência da comunhão com seu Criador. Por outro lado, o espírito fica amortecido, latejando no íntimo, esperando a Luz da Vida revitalizá-lo, mas a alma incontida anseia por algo mais, por eternidade, ou como diria Davi, "não descansarei enquanto não me satisfizer com a Tua semelhança".

Todos nós temos carimbados em nosso DNA uma vocação para as alturas, um desejo de voar, de superar-se, de atingir o topo do universo. Esse sentimento está embutido no coração de todos nós. Jesus como homem sentia essa saudade da glória que tinha antes, a ânsia de comunhão com seu Abba por toda a eternidade. Não é à toa que dispensava grande parte de sua agenda a contemplação do Pai na oração nos momentos de solitude nos montes, nos primeiros alvores do amanhecer.

Paulo também cultivou seu lado transcendental quando deixou de lado uma vida de religiosidade exemplar, prestígio e poder, para se ater exclusivamente na busca incessante do conhecimento de Cristo, seu desejo maior.

Esse antagonismo existe e sempre existirá no homem enquanto passageiro do tempo sobre essa terra. Como diria Leonardo Boff, esses dois mundos se justapõem e até se contrapõem. Através de toda a mecânica da oração e da meditação buscamos criar pontes para chegar ao Céu, à transcendência e a Deus.

Assim pois, fica carimbada no ser humano a propensão de romper barreiras, os interditos e as trincheiras dos condicionamentos destrutivos que se colocam como barreiras e induz o homem a sempre superar seus limites.

Nesse sentido, minha própria transcendência se evidencia em naturalmente sentir-me rebelde sem causa, fora-da-lei assumido, um agitador natural, um inconformado com o status quo prevalecente, de não me enquadrar na fôrma do tradicionalismo, a romper com a membrana enrijecida do legalismo, e a buscar alternativas criativas e conspiratórias que tragam mudanças profundas na mentalidade fossilizada da cristandade vigente.

A busca da transcendência me auxilia também na auto-análise que faço, a me obrigar a contemplar no espelho da realidade e ver os traços de minha maturidade como pessoa e como ser físico, com um corpo falível, fadado à doença e a exterminação desse invólucro em que somos confinados enquanto sobrevivemos às vicissitudes sobre a face da terra. Impressiona-me bastante, vislumbrar o futuro e perceber que envelheço a cada passo da caminhada, apesar de não notar. Aos cinqüenta e um anos me ocorre que já chego a perceber as marcas de minha própria finitude. Dores que se instalam gratuitamente nas costas e nas juntas das pernas, a "barriguinha acentuada" que persiste em se acomodar no abdômem ad infinitum, os cabelos caindo e os que persistem se tornando enbranquecidos, tudo isso chegando a se constituir em um sério “problema de junta”.

Gabriel Garcia Marques tem razão quando disse que as primeiras mudanças são tão lentas que mal se notam, e a gente continua se vendo por dentro como sempre foi, mas de fora os outros reparam. Mas a mente, por conseguinte, vai se tornando cada vez mais arguta e ágil e a vida vai se transmudando, cada vez mais vivida no sentido de realização pessoal. Essa é a tendência natural, o ciclo da vida, mas resta enfim a esperança de invadir finalmente o portal derradeiro, quando nós, águias vocacionais, inconformadas com a vidinha de galinhas no terreiro de terra cinzenta, deixaremos de bicar minhocas e alçaremos o vôo da ressurreição em direção ao infinito, quando o que é mortal será revestido da imortalidade.






Por Manoel dC

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