Como seria o texto do balanço da Petrobras se eliminássemos eufemismos e o traduzíssemos para o português? Minha tentativa vai abaixo – aceito sugestões.
A Companhia entende que será necessário realizar ajustes nas demonstrações contábeis para a correção dos valores dos ativos imobilizados que foram impactados por valores relacionados aos atos ilícitos perpetrados por empresas fornecedoras, agentes políticos, funcionários da Petrobras e outras pessoas no âmbito da “Operação Lava Jato”.
Seguinte: teve uma roubalheira danada por aqui, como vocês estão cansados de saber. Agora (ai que vergonha!) a gente vai ter que estimar quanto roubaram.
No entanto, em face da impraticabilidade de quantificar de forma correta, completa e definitiva tais valores que foram capitalizados em seu ativo imobilizado, a Companhia considerou a adoção de abordagens alternativas para correção desses valores: i) uso de um percentual médio de pagamentos indevidos, citados em depoimentos; ii) avaliação a valor justo dos ativos cuja constituição se deu por meio de contratos de fornecimento de bens e serviços firmados com empresas citadas na “Operação Lava Jato”. Essas alternativas se mostraram inapropriadas para substituir a impraticável determinação do sobrepreço relacionado a esses pagamentos indevidos.
Gente, mas isso é difícil demais! Envolve matemática. Ninguém aqui na Petrobras sabe patavina sobre preço real das coisas. Na verdade tinha uma senhora que sabia, mas ela era meio chatinha e a mandamos pra Cingapura. Até pensamos nuns jeitos de calcular, mas já era 16h30, fim de expediente, daí desistimos. Ia dar um trabalho…
O resultado das avaliações indicou que os ativos com valor justo abaixo do imobilizado totalizaram R$ 88,6 bilhões de diferença a menor. Os ativos com valor justo superior totalizaram R$ 27,2 bilhões de diferença a maior frente ao imobilizado.
Resolvemos perguntar para a dona Maria, a senhora que traz café aqui na sala do conselho. “Diga um número, dona Maria!” Ela disse 88, o que a maioria dos conselheiros achou razoável e de boas vibrações. Mas 88 milhões ou bilhões? Passamos duas horas discutindo isso, até decidirmos que 88 bilhões soava mais natural para uma empresa do nosso tamanho. Pra ficar verossímil, quebramos para 88,6 bilhões.
No entanto, o amadurecimento adquirido no desenvolvimento do trabalho tornou evidente que essa metodologia não se apresentou como uma substituta “proxy” adequada para mensuração dos potenciais pagamentos indevidos, pois o ajuste seria composto de diversas parcelas de naturezas diferentes, impossível de serem quantificadas individualmente, quais sejam, mudanças nas variáveis econômicas e financeiras (taxa de câmbio, taxa de desconto, indicadores de risco e custo de capital), mudanças nas projeções de preços e margens dos insumos, mudanças nas projeções de preços, margens e demanda dos produtos comercializados, mudanças nos preços de equipamentos, insumos, salários e outros custos correlatos, bem como deficiências no planejamento do projeto (engenharia e suprimento).
Mas depois de meia hora tentando fazer os cálculos, percebemos que seria um trabalho chato demais da conta. Esses cálculos são pura loucura, cheios de variáveis, taxa de câmbio, desconto, preço, insumos, salários e mais um montão de coisas pra complicar, além da barbeiragem dos engenheiros.
Com objetivo de divulgar as demonstrações contábeis do terceiro trimestre de 2014 revisadas pelos auditores independentes, a Companhia está avaliando outras metodologias que atendam às exigências dos órgãos reguladores (CVM e SEC).
Enfim, empurramos o problema com a barriga. Poxa, CVM e SEC , deem uma ajudinha!
Por Leandro Narloch
Nenhum comentário:
Postar um comentário