Desde que Ricardo Pessoa começou a colaborar com as autoridades, essa pergunta tornou-se um complemento rotineiro aos comentários para quaisquer fatos. Milton Pascowitch fechou seu acordo de colaboração, e José Dirceu pediu um habeas corpus preventivo. Será que ela termina o mandato? Jorge Luiz Zelada, ex-diretor da Petrobras, está preso.
Será que ela termina o mandato? O deputado Eduardo Cunha sugere que seu aliado Michel Temer abandone a coordenação política do governo porque, enquanto ele costura alianças de dia, o PT descostura-as à noite. Se o PMDB se afastar ainda mais do Planalto, será que ela termina o mandato?
O regime democrático brasileiro elegeu quatro presidentes, Fernando Collor, FHC, Lula e Dilma. Um foi para casa antes de concluir o mandato. Se isso acontecer a outro, chega-se a uma taxa de mortalidade de 50% (a do vírus Ebola esteve em 70%).
Indo aos mecanismos práticos existentes, Dilma Rousseff pode ser impedida pelo Congresso. Neste caso, assume Michel Temer para concluir o mandato. Trocar Dilma por Temer vem a ser o quê?
Dilma também pode ter o seu mandato anulado pelo Tribunal Superior Eleitoral, e há processos que, algum dia, podem acabar dando nisso. Neste caso, a vice de Temer vai junto, e assume Aécio Neves. No país do futebol, entregar a taça a quem perdeu a final é uma coisa meio girafa.
Noutra hipótese, o TCU pode rejeitar as contas da doutora, enviar sua decisão ao Congresso e vê-la referendada, o que provoca um impedimento com padrinho. É uma fórmula engenhosa, mas o Tribunal de Contas não chega a ser um tribunal, e sua relação com as contas dos poderosos jamais encantou a plateia.
Nenhum desses três mecanismos fica de pé sem o ronco da rua. Não se pode dizer se ele virá, nem como virá. Quando se tratava de mandar Collor para casa, empossar Itamar Franco pareceu uma boa ideia. E foi.
Presidente com dígito de aprovação antes de completar um ano é coisa nunca vista. Quem levou a doutora Dilma à situação em que está não foi a oposição, muito menos os moinhos de vento que o PT vê a cada esquina. Foi ela mesma.
Como sairá dessa, só ela poderá saber. As razões pela qual entrou nessa enrascada foram muitas. Talvez a maior delas, por desnecessária e megalomaníaca, tenha ocorrido dias depois de sua vitória no ano passado, quando o PT tentou atropelar o PMDB.
O fascínio petista pelo caminho do brejo
Em oito meses aconteceram tantas coisas em torno do governo da doutora que algumas delas parecem esquecidas. Às vésperas do segundo turno da eleição de 2014, Dilma Rousseff, horas antes de uma reunião com o companheiro João Pedro Stédile e outros chefes de movimentos sociais, anunciou que “a reforma política é a condição para o efetivo combate à corrupção”. O comissariado propunha uma reforma plebiscitária com um receituário que poderia incluir o famoso voto de lista.
Nesses dias os companheiros já sabiam que o Congresso não comprava sua reforma. Mais: sabiam que Eduardo Cunha era candidato a presidente da Câmara. Inebriados pela vitória, resolveram atropelar. Enfrentariam Cunha e tocariam a agenda do rolo compressor (já tinham escolhido um banqueiro para sequestrar o programa econômico de Aécio Neves, mas, como podiam tudo, isso era um detalhe).
A reforma plebiscitária e o lançamento do petista Arlindo Chinaglia para disputar com Eduardo Cunha indicavam que o PMDB seria atropelado. Foram ao embate, tomaram uma sova, pulverizaram a liderança parlamentar do governo e acabaram entregando a coordenação ao príncipe do PMDB, Michel Temer. Era isso ou rolar escada abaixo. Queriam tudo, entregaram os anéis e alguns dedos.
Por Elio Gaspari
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