segunda-feira, 20 de julho de 2015

A demonização de Eduardo Cunha, a "ética" seletiva e o crente na laje


“Quem espera que o Diabo ande pelo mundo com chifres será sempre sua presa.” – Schopenhauer

A campanha dos petralhas intensificou o tom contra o presidente da Câmara dos Deputados, soltando fogos de artifício com a denúncia do delator de que Eduardo Cunha teria recebido US$ 5 milhões em propina. Agora, delator não é mais indigno de respeito: ao contrário, os petralhas amam a delação, desde que seletiva, claro. “Corrupto, sua casa caiu!”, gritam aqueles a soldo do governo. O inimigo número um de Dilma, a pedra no seu sapato, aquele que pode abrir um processo de impeachment contra ela, foi atingido, e é isso, só issoque importa.

Quem pode defender Cunha? Que papel ingrato! O espantalho perfeito, portanto, dos petralhas: vejam, issoé a oposição, o conservadorismo, o ícone dos reacionários! Please, allow me to introduce myself: the devil! Oh, really?! Santo é que Cunha definitivamente não é. Mas… e Lula? E Dilma? E Dirceu? Ah, deixemos os petistas em paz, não é mesmo? Afinal, eles são camaradas, companheiros de esquerda e, no mais, as estatais controladas por eles dão um dinheirão para os artistas engajados! Quem não quer uma boquinha no Banco do Brasil?

A revolta daqueles que agora passam a respeitar delação e valorizar a ética é um tanto seletiva. Petistas podem ser acusados de tudo que ficam blindados, protegidos, esquecidos. Mas acusaram Cunha, aquele inconveniente que quer reduzir a maioridade penal dos assassinos e estupradores? Corrupto! Safado! Demônio! Sua casa caiu!!! Como essa gente consegue se olhar no espelho toda manhã?

O petralha é aquele que nunca teve moral, que jamais respeitou a ética universal, e que só tem um princípio na vida: se dar bem. A ética, para um petralha, é algo a ser usado de forma seletiva, para atacar inimigos apenas, nada mais. A ética petista é não ter ética! A corrupção do PT, o tráfico de influência de Lula, o lobista Dirceu, nada disso lhe incomoda. A suposta propina de Cunha tampouco, mas como deixar passar essa oportunidade para demonizar o obstáculo aos companheiros generosos com verbas públicas, não é mesmo?

O Capeta, aquele que “chegou ao Brasil 500 anos atrás” (pois antes era um paraíso, claro), o mesmo que esquartejou o “comuna” Tiradentes (estranho, já que a Inconfidência Mineira era um movimento inspirado na Revolução Americana liberal que buscava descentralizar o poder político e se rebelar contra o quinto, sendo que hoje pagamos dois quintos de impostos e a esquerda aplaude, pedindo mais) – o Capeta, dizia, está hoje no corpo de Cunha, afirmam os “humoristas que se levam a sério”. Lula? Dilma, que ferrou com nossa economia? Não, o Demo tomou a carcaça de Cunha mesmo. Sobre os petistas há apenas uma aura iluminada e reluzente, como as moedas de ouro que o BB paga para os “humoristas” engajados.

E o grande problema de Cunha não é, claro, ser ou não corrupto, pois isso os petistas são aos montes; mas sim ser… “reaça”! E por que os comunas dizem isso? Cunha é, por acaso, um seguidor de Burke? Nem deve saber quem foi esse pensador importante. Nada disso. Cunha simplesmente comanda parte da bancada evangélica que não se curva diante da pauta “progressista” que esses “artistas e intelectuais” defendem. Quer, vejam só que absurdo!, reduzir a maioridade penal dos estupradores, algo que quase 90% dos brasileiros desejam, esse “povo ignorante” (nessas horas o povo é um atraso de vida). Demônio!

Para citar a grande “pensadora” Britney Spears, do mesmo nível intelectual do nosso “humorista” engajado que foi parido pela porta dos fundos, e manter as frases em inglês para dar um ar de sabedoria elitizada: Oops! I Did it Again! É que a coisa está ficando repetitiva: vem o Greg com sua coluna na segunda falando um monte de bobagem, e logo depois o filósofo Luiz Felipe Pondé refutando as baboseiras do “progressista” e “funcionário” do BB. O ataque demoníaco a Cunha hoje, em boa parte por ser representante de evangélicos e não pela corrupção, foi seguido de uma excelente coluna de Pondé explicando a distância entre a nossa “elite cultural” e o “povo”, sempre usado, quando oportuno, pela mesma elite que julga falar em seu nome. Diz Pondé, no que parece um golpe certeiro contra os Gregs da vida:

Digamos a verdade: a elite cultural não aprecia muito o povo. Dito de forma direta assim, parece uma insensibilidade perigosa em época de ofendidos por todos os lados.

A vida nunca foi tão fácil na maior parte do planeta Terra e nunca houve tanta gente chata e mimada reclamando de tudo. Não só a longevidade aumentou nos últimos anos, a chatice autoconfiante também.

[...]

O povo é aquela entidade abstrata que, quando vota em quem achamos certo, cumpriu plenamente com sua soberania na democracia (e alguns até gozam quando falam frases do tipo “o povo decidiu!”). Mas quando o povo fala alguma coisa com a qual não concordamos, ai, ai, ai!. Então dizemos: “ignorantes, alienados, mal-educados, reacionários, crentes!”.

Ou, como num ato de condescendência, sacamos a hipótese que serve para tudo: falta educação!! Do contrário, eles seriam a favor do aborto, contra a diminuição da maioridade penal, seriam todos ateus (e se fossem religiosos, pelo menos, seriam budistas light, católicos “da libertação”, que é gente como “nóis”, ou do candomblé, que é religião de oprimido, então tudo bem). E mais: seriam a favor dos gays e associados, não falariam frases idiotas como “vamos defender a família”. Resumindo a ópera: pensariam como nós (assumindo que esse “nós” existe como unanimidade).

E aí vem o pesadelo: o Congresso tem muito crente! Esses reacionários vão tomar a Paulista de mim! Nossa elite intelectual talvez descubra que tem gozado com a própria voz e com o próprio pensamento há muito tempo. E esqueceu que o mundo não cabe em nossos papos cabeça.

[...]

Chega a ser hilária nossa ambivalência nisso: quando o povo faz algo que cabe em nossa concepção “progressista”, o povo é soberano e devemos deixá-lo “falar” e decidir diretamente. Quando o povo sai com absurdos como votar num “Congresso crente”, aí não vale.

[...]

Queremos que o povo tenha a educação que nós queremos, aquela que “esmagará a infâmia” –leia-se, a religião–, como dizia o iluminismo francês, responsável por nossa ignorância com relação ao “povo”. O Brasil é um país religioso. Bem-vindos ao Brasil que não cabe em nossas crenças.


Voltando ao começo: é a corrupção de Cunha que incomoda tanto os “humoristas” engajados e os “intelectuais” petistas? Claro que não! Se fosse, eles odiariam o próprio PT, já que nunca antes na história deste país se roubou tanto. O que eles odeiam em Cunha é ele falar por parte dos evangélicos, esse “povo” que não aderiu ainda ao relativismo moral exacerbado, que nunca leu Foucault, que não acha cool o filho de 12 anos gostar hoje de meninas e amanhã de meninos, que não considera o aborto uma decisão banal como cortar a unha ou o cabelo, e que não trata estuprador e assassino “dimenor” como “vítima da sociedade”. Isso é inadmissível pelos Gregs da vida!

Ou seja, aqueles que demonstram essa revolta seletiva e odeiam Cunha o fazem pelos motivos errados, odeiam, no fundo, o povo brasileiro, um povo “reacionário”, “conservador” e, ó céus!, “crente”. Se ao menos esse bando de ignorantes lesse algum ícone da Escola de Frankfurt…

Please, allow me to introduce myself: meu nome é Legião, e falo em nome de muitos, do “povo”. Mas sou apenas uma elite cultural e financeira mimada, criada pela vovó com tudo do bom e do melhor, que julgo ter “direito” a tudo e também quero distribuir esse “direito” a todos, usando os recursos alheios, e recebendo em troca verbas públicas, pois sou muito abnegado e altruísta, uma alma nobre. Querem provas? Ora, eu odeio Cunha, o Capeta em pessoa. Do Lula, da Dilma e do Dirceu eu gosto, tá? E muito! Agora preciso ir negociar o aumento do cachê do BB…






Por Rodrigo Constantino

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