terça-feira, 27 de janeiro de 2015

A democracia, o Brasil e o mundo


Está mais do que na hora de o atual governo rever a sua política externa
Em janeiro de 1933, o presidente Hindenburg nomeia Hitler chanceler. Seu partido tinha obtido uma expressiva votação e a sua liderança já se afirmava naquele então. O novo chanceler, imediatamente após assumir o poder, tomou medidas que visavam simplesmente a abafar e a suprimir qualquer espaço público, que pudesse obstaculizar o seu projeto totalitário.

Com tal intuito, utilizou-se de um artigo da Constituição de Weimar que lhe dava poderes de governar por decreto. Fez, ainda, passar uma lei, a Lei de Concessão de Plenos Poderes, também chamada de Lei Habilitante, que lhe conferia Poderes Legislativos. Ademais, suprimiu as liberdades civis.

Note-se que todas essas medidas de supressão das liberdades e da divisão republicana dos Poderes foram tomadas, por assim dizer, “legalmente”, seguindo a Constituição vigente e os trâmites legislativos. A subversão da democracia foi feita seguindo ritos republicanos.

Nada muito diferente do que ocorre atualmente com os países bolivarianos, expressões do “socialismo do século XXI”. O parentesco entre os nazistas e esses “socialistas” é, por demais, evidente. Chávez, o socialista/nazista seguiu o mesmo caminho. Eleito democraticamente, voltou-se diretamente contra as instituições democráticas. Seu sucessor segue “religiosamente” os seus passos.

Sufocou o Poder Judiciário, submeteu o Poder Legislativo, passou a governar por decretos (sua Lei Habilitante) e suprimiu progressivamente as liberdades civis, com especial atenção à liberdade de imprensa e dos meios de comunicação. Empregou também grupos paramilitares para esmagar e assassinar os seus opositores, numa réplica das SA de Hitler.

O seu modelo foi imitado pelo Equador, pela Bolívia, pela Nicarágua e, com algumas diferenças, pela Argentina, uma vez que esse país possui uma forte tradição violenta e autoritária herdada do peronismo.

É com alguns desses países que o Brasil guarda relações privilegiadas, unidos no Mercosul e na Unasul, irmanados em um mesmo projeto “anti-imperialista”e “anticapitalista”. Curioso, ainda, é o fato de o Mercosul possuir uma “cláusula democrática”, que deveria ser assumida por todos os seus membros.

De qual “democracia” estaríamos então falando? A totalitária que se caracteriza pela supressão das liberdades civis, da liberdade de imprensa e dos meios de comunicação em geral? A da abolição da divisão republicana dos Poderes e a da criminalização dos adversários e de qualquer contestação?

O que o Brasil, vivendo em uma democracia representativa, apesar de algumas tentativas de supressão da liberdade de imprensa e dos meios de comunicação, tem a ver com isso? O que significa bem essa afinidade eletiva com regimes liberticidas?

Está mais do que na hora de o atual governo rever a sua política externa. Para fazer acordos comerciais bilaterais, o Brasil está, inclusive, atrelado a essas más companhias. A Argentina é, por exemplo, um obstáculo para uma maior inserção do país no mundo. Enquanto isso, o país vizinho corre para a sua ruína e vive um momento particularmente delicado de suas instituições republicanas, com a morte do promotor Alberto Nisman.

Ele era encarregado do processo relativo ao atentado antissemita à Associação Mutual Israelita da Argentina (Amia), em 1994, no qual morreram 85 pessoas, muitas delas crianças, e mais de 300 ficaram feridas. Esse atentado foi posterior a outro, dois anos antes, contra a Embaixada de Israel, no qual morreram 29 pessoas.

O promotor, além de já ter indiciado os autores destes atentados, o Irã dos Aiatolás e o Hezbollah, estava incriminando a presidente Cristina Kirchner e o seu ministro de Relações Exteriores, Héctor Timerman. Ambos estariam encobrindo esses atos mediante um acordo diplomático-comercial com o Irã, em uma absurda cooperação dita judicial para averiguação destes crimes. Ora, os autores dos crimes já foram identificados e têm contra eles um mandado de prisão pela Interpol. Mais ainda, o promotor morto apresentaria ao Congresso da Argentina, na última segunda, as provas de suas acusações.

O suposto “suicídio” do promotor é, certamente, uma das tantas farsas do governo da presidente Cristina Kirchner e de seu marido, seu predecessor. Já tinham dado um calote, em 2011, em seus credores, em um processo que se arrasta até hoje na Corte de Nova York. Ninguém confia nos índices de inflação publicados pelo governo, por serem manipulados. As estatísticas argentinas são objeto de chacota internacional. A liberdade de imprensa e dos meios de comunicação é cada vez mais violada.

O assassinato de Alberto Nisman é uma amostra da falência das instituições republicanas na Argentina. Se tivessem um mínimo de seriedade, já teriam chamado peritos independentes, não cubanos evidentemente, para investigar as circunstâncias desta “estranha” morte.

Em 1801, Hegel, observando os desastres institucionais e constitucionais de sua Alemanha, fez a seguinte afirmação: “A Alemanha não é mais um Estado”. Esperamos que os argentinos, indo agora às ruas, demonstrando indignação com esse crime, ergam barreiras contra essa evidente deterioração institucional, que abala ainda mais os alicerces de sua democracia.

Contudo, parece que a maior preocupação da diplomacia brasileira consiste em chamar para consultas o seu embaixador na Indonésia, pelo fato de o país, seguindo a sua Constituição e aplicando as suas leis, ter executado a pena de morte em um traficante de drogas brasileiro. Ou seja, o país está mais preocupado com a execução legal de um traficante de drogas do que com a democracia em seu próprio continente.

Aliás, a leniência com o tráfico de drogas no país é uma verdadeira calamidade, o que se expressa, inclusive, nesta medida da política externa brasileira. Como se não bastasse, a presidente Dilma não foi a Davos, mas preferiu participar da posse do presidente Evo Morales, da Bolívia, outro liberticida. Tais escolhas são, deveras, preocupantes! É o mínimo que se pode dizer!




Por Denis Lerrer Rosenfield

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