domingo, 18 de maio de 2014

Artistas se aventuram em marcar posição política e provocam reações


A arte e a política sempre andaram juntas, mas nem todos os artistas gostam de misturar as duas coisas. É que muitas vezes essa combinação pode render discussões acaloradas e muitas críticas, principalmente em tempos de explosão das redes sociais, em que todos dão palpite em tudo. Quem não se lembra da atriz Regina Duarte que, na disputa presidencial de 2002, apareceu no programa do então candidato José Serra (PSDB) declarando ter medo da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva. Ou das atrizes Cláudia Raia e Marília Pêra que pediram votos na eleição de Fernando Collor, em 1989, e foram criticadas até mesmo pela classe artística que, na disputa, cerrou fileiras para tentar, sem sucesso, eleger Lula na época. Depois do episódio, considerado traumático, Cláudia Raia não dá mais pitaco em política. Mas nem todos se esquivam de dar palpites nesses assuntos.

Que o diga o cantor Ney Matogrosso que, semana passada, em entrevista a um programa da televisão portuguesa, criticou o PT, a saúde no Brasil e os gastos com a Copa do Mundo e derrapou ao tecer comentários, equivocados, sobre o programa Bolsa Família. A fala do ex-Secos & Molhados — banda que, no auge da ditadura militar, desafiou os chamados bons costumes — provocou a ira dos simpatizantes do governo Dilma Rousseff, que rebateram a fala do cantor de que o programa de complementação de renda não exige a matrícula na escola e que as mulheres fazem mais filhos para ganhar o benefício. O Bolsa Família exige que as crianças estejam matriculadas e estabelece um número máximo de cinco filhos para o complemento do benefício, que hoje é de R$ 70 mensais. Mas se de um lado houve críticas, do outro foram só aplausos, e a entrevista do cantor foi reproduzida na internet dando munição para os críticos da realização do Mundial no Brasil. Procurado, o cantor não quis comentar o episódio.

Mas não foi só ele quem esteve na berlinda esta semana. O ator Wagner Moura — que já manifestou simpatia pela Rede e por sua fundadora, a ex-senadora Marina Silva (PSB), mas não pelo partido ao qual ela está filiada — anunciou estar de malas prontas para deixar o Brasil, alegando estar impossível viver no país. “Tenho o maior amor por esse país, mas não está dando para viver aqui. Nunca pensei que fosse dizer isso, mas estou gostando que meu próximo projeto vai me tirar do Brasil por uns dois anos”, disse o ator, em entrevista no dia 14. Dois dias depois foi rebatido pelo cineasta Jorge Furtado que, em seu blog, lamentou, sem citar Moura, a declaração. “Fico triste ao ver artistas brasileiros, meus colegas, tão mal-informados. Dizer que não dá mais para viver no Brasil logo agora, agora que milhões de pessoas conquistaram alguns direitos mínimos”, escreveu o diretor de Meu tio matou um cara.

Embates

Mas os artistas campeões de polêmicas envolvendo questões políticas são o ator José de Abreu, defensor ferrenho dos governos Lula e Dilma, e o vocalista do Ultraje a Rigor, Roger Moreira, que critica tudo no Brasil. Quem acompanha a militância dos dois nas redes sociais conhece bem a divergência de opiniões e os embates travados entre eles por meio do miniblog. Na semana passada, Roger interrompeu um show para criticar a militância digital do PT. Roger diz não se importar com polêmicas nem com reações iradas às declarações. “São acusações sem fundamento ou lógica, mas isso não interessa, essa é a tática porca da esquerda, repetir uma mentira até virar verdade”, disse o cantor à reportagem do Correio/Estado de Minas.

Roger diz que se envolve na política por ser um “idealista”. “Porque realmente gostaria de ver um país melhor para mim, que também faço parte do povo.” O cantor afirma que pouco se importa com quem está no poder e que sua maior preocupação não é o roubo e a corrupção. “É a ameaça já parcialmente instalada de outra ditadura tomar conta do país, ditadura esta muito pior que a anterior por ser uma ditadura de pensamento, sorrateira e traiçoeira, que mantém o povo igualmente miserável e dependente.”

“Ator de teatro, cinema e tevê, processado duas vezes por Gilmar Mendes (ministro do Supremo Tribunal Federal) por tuitar”, é assim que José de Abreu se define no Twitter onde milita diariamente. No começo de sua atuação na rede social, ele diz ter ficado incomodado com as agressões por causa de sua postura, mas depois relaxou. “Vi que isso não me atinge. É como me chamar de japonês ou de repolho.”

Sua volta à cena política ocorreu depois do episódio do mensalão, em 2005. “Eu resolvi voltar a trabalhar a favor do Lula na época do mensalão. Eu tinha certeza, sabia, que as classes mais reacionárias e tradicionais iam reagir ao governo Lula e, quando surgiu o mensalão, tive certeza da tentativa de um golpe branco. É o que está acontecendo até hoje.” José de Abreu diz ainda ter certeza de que voltou a fazer política no momento certo. Ele garante que não vai sair candidato, como chegou a ser ventilado, mas não poderá fazer campanha oficial, pois estará em uma novela durante a campanha e a legislação veta sua aparição em programas eleitorais.

“Antes, ficava incomodado com as agressões, mas depois relaxei. Vi que isso não me atinge. É como me chamar de repolho”
José de Abreu, ator de teatro e tevê



Fonte: Correio Braziliense

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